sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Cambalhotas para espantar o frio

Haverá algum processo mecânico para a tomada de decisões?

Dou por mim, nos últimos tempos, a ser mais impulsiva do que alguma vez me lembro de ter sido. Parece-me (e sobretudo às pessoas que rodeiam) que ando a mangar com o destino. Decido assim do pé p’ra mão dar cambalhotas à vida, exactamente com o mesmo objectivo com que dava cambalhotas (a sério) quando era criança: a ver se era capaz de as dar. E depois de saber que conseguia, a ver se as tornava mais perfeitas. E depois, talvez as contasse… Não sei dizer já com exactidão por que dava cambalhotas. Mas dava muitas. Até fazia um mortal para a frente em cima da terra recém lavrada. Lembro-me que era das melhores sensações que alguma vez experimentei.

Dei recentemente uma cambalhota virada para sul. Agora darei outra voltada para norte. Um norte frio e sem luz. Talvez porque me inquieta ou aquiesce demais, este país. Vou ali mais para norte, certificar-me que o meu país existe. Só vendo. Só vendo de longe, me parecerá real. Vou ver. Vou ver o que vejo.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Au Revoir Simone - Hurricanes


In a world of make-believe

Talks a lot, but can't you see

It means more to you than me

Than me

Think before you speculate

Take the fear that you create

Don't assume we're so afraid of them

And you say

Na na na na...

Na na na na...

If you stop and disappear

Doesn't sound I watch you here

When dreaming takes you when you want to be

Don't follow the status quo

Picture where you'd like to go

Take your time but always know you're there

And you say

Na na na na...

Na na na na...

Na na na na...

This message is for all the people

That people who are always waiting

This message is for all the people

That people who are always waiting

Waiting, waiting, waiting, waiting, waiting, waiting

This message is for all the people

That people who are always waiting

This message is for all the people

That people who are always waiting

Waiting, waiting, waiting, waiting, waiting, waiting

This message is for all the people

That people who are always waiting

This message is for all the people

That people who are always waiting

Waiting, waiting, waiting, waiting

segunda-feira, 3 de dezembro de 2007

Gayhane


Estava para me nascer um poema

Lembras-te, Pedro?

Lembras-te da noite em que os turcos rebentavam

Lascívia pelas ancas

E o teu olhar nómada se sentava nessa imagem?

Estava para me nascer um poema

Lembras-te, Pedro

Que me cresciam vontades

De te tatuar imagens em movimento

Nas costas.

Lembras-te, Pedro

dos homens mais lindos da terra

Dos homens nos homens?

Estava para me nascer um poema.

E se não fosse tão noite dentro de mim

Ter-me-ia crescido outra espécie de poesia

No manear excessivo de uma anca turca.

Lembras-te, Pedro?

Não me nasceu um poema.

Nasceste-me tu

A acreditar que amar era isto:

Uma explosão de olhar

De ali estar

De ali ficar

De sentir ali.

Lembras-te, Pedro

Da noite em que os turcos rebentavam

Lascívia pelo olhar

E te maneavam as ancas?

Lembras-te, Pedro?

Estava para me nascer isto.

sábado, 6 de outubro de 2007

...que voltei de África...



Consta em vários registos que regressei de África para voltar com a urgência que os sorrisos que trouxe me exigem.
Que estou por cá com compreensão nas mãos e manifestos de alegria redigidos no peito. Que se me desfizeram dúvidas, que me esclareci, que compreendo mulheres e homens e crianças e algumas cobras...

Que até já me compreendo a mim, quase em absoluto.

Que sorrio tanto hoje, que nem percebo porque não fiz o exercício quotidiano dos sorrisos, em todas as jornadas da minha vida. Que deixarei de fazer declarações de amor, porque já sei fazer declarações de felicidade. Que me declaro feliz, sem o mínimo medo a assolar-me o espírito. Que me declaro. Que me vejo viva, que me vejo a viver, que até já me posso ver morrer, sem o susto da palavra escrita ou dita ou vista. Que estou aqui, onde sempre estarei, neste centro de felicidade, outrora tão críptico, agora tão livre e claro.
Que fui a África aprender a ser feliz. Que talvez seja boa aluna, afinal...

"Djarama" , meu continente aberto!

terça-feira, 17 de julho de 2007

coisas

Mudei de casa. Ou seja, regressei a Casa (da mamã).
Começo a minha adaptação ao isolamento que um mês e meio do mapa profundo de África me irá proporcionar. mas por enquanto, ainda consigo dar umas escapadelas ao meu ex-local de trabalho e entrar nesta maravilhosa sala de chuto da comunicação.
De resto, também não tenho o que escrever.
Vou fazer planos para o trabalho de voluntariado, com a firme convicção de que de nada me servirão. Mas vou.
E basicamente era só para dizer que vou estar alheada disto por uns meses.
(caso alguém tenha entrado no tortuoso caminho da angústia, provocada pela ausência das minhas palavras, pode agora sossegar:).

terça-feira, 10 de julho de 2007

Amélia

Amélia levantou-se sem vontade. Percebeu que não queria tomar banho, não queria comer, não estava para conversas, não queria trabalhar e não queria pensar nas coisas que lhe poderia apetecer fazer. No entanto, levantou-se, aniquilou a preguiça e empurrou à sua frente a iniquidade de mais um dia.
Nesse dia, soluçou banalidades na presença de pessoas, ouviu as dificuldades de um ou dois amigos, e dois ou três disparates anónimos, gastou tempo ao telefone, disse que sim a uma proposta (perfeitamente dispensável) a que só queria dizer não, concordou com pessoas que despreza (para algumas até sorriu) e quando voltou para casa, ignorou o sofá, ignorou o marido, ignorou os filhos, ignorou o cansaço, mas não soube ignorar o pó, a roupa por lavar, o jantar… Antes de dormir repetiu três vezes, em frente ao espelho, que era feliz. Respirou fundo e enfiou-se na cama sem um pensamento que a perturbasse.
Conheço Amélia. Amélia acredita que é feliz. E essa crença críptica, descodificada por um espelho é, de facto, o início dessa felicidade. Todos os dias uma vontade de vida se apodera dela. Todos os dias essa vontade se sobrepõe à falta de vontade de fazer as coisas que faz. Todos os dias, Amélia é feliz. Amélia tem uma necessidade básica - a felicidade - e assume as despesas desse compromisso diário.
Um sentimento próximo da inveja toma conta de mim. Não direi sempre, mas pelo menos uma vez por semana gostava de ser Amélia. Não para fazer coisas que me desagradam (porque nisso sou perita), mas para conseguir ser feliz, ou dizer que sou feliz, enquanto me vejo envolvida por essas contrariedades.
Não consigo. Detesto a incoerência e o “faz de conta que corre bem, para não veres o que corre mal”.
Essas coisas que faço para matar tempo ou para matar as etapas da edificação das relações matam-me todos os dias um pouco. Não suporto os gestos consentidos, só para evitar constrangimentos, ou o nível de condescendência que invariavelmente me imponho com os meus interlocutores. Não me fazem mais feliz, estas coisas que faço todos os dias sem vontade. Não tenho um espelho que me suporte a mentira da felicidade confessa. Quero aprender a dizer “não” sem que isso me angustie. Mas, por muito que ensaie, só me saem “nãos” às pessoas indevidas, ou àquelas a quem sei que têm a capacidade de suportar todos os meus surtos de mau feitio declarado e que terão a capacidade de me acompanhar até ao mais inesperado “sim”.
Encravou-se-me na garganta um “não” de uma obesidade mórbida. Sei que o hei-de expulsar, só não sei se o farei na direcção certa.
Dedico estas palavras às pessoas, cuja paciência e o companheirismo nunca se abalaram com os meus tumultos. Dedico-as a todos os nomes inscritos no meu império de sensações, a memória. E a uma ou outra Amélia, que resiste à contemplação dos seus dias tortuosos, apesar do culto dos espelhos.

Não sei

Acordo e faço-me perguntas para as quais tenho sempre uma resposta pronta e categórica: não sei.
Não sei das pessoas, não sei das emoções, não sei dos lugares, não sei do tempo, não sei de mim.
Não sei o que será de mim e nem sei dizer se isso me preocupa. Tenho alguns planos, muitos até, e por serem tantos há outras tantas possibilidades de os não traçar.
Vou para África. Já disse isto?! (mas isso não é um plano é um projecto de vida).
Há poucos meses, lugares como Boé, Gabú ou Béli nem chegavam a ser nomes. Agora, pouco passam de nomes, mas são talvez as palavras que mais digo, penso e enfio nos sonhos. Nomes cheios de lugares e pessoas e momentos e medos que eu não conheço, que talvez não compreenda.
Há dúvidas que me fazem falta, quanto mais não seja, porque o percurso da dissipação é necessário. Assim como há uma certa ignorância que não me esmaga.
Não sei bem porque digo isto, mas talvez se avizinhe a experiência mais definitiva da minha vida e eu... a modos que, se me perguntarem o que sinto sobre isso... Não sei.